publicado em 11/05/2022
Discussão recorrente entre os contribuintes e a Fazenda Nacional, os parâmetros de cálculo das contribuições previdenciárias nas obras de construção civil ganharam novos contornos com a edição da Instrução Normativa nº 2.021, pela Secretaria da Receita Federal do Brasil.
Como regra, as contribuições previdenciárias são apuradas sobre a folha de pagamento, a qual singelamente pode ser conceituada como o valor total das remunerações pagas aos colaboradores em um mês. Na indústria da construção civil, além dos valores pagos aos próprios funcionários, as empresas são também obrigadas a efetuar a retenção de contribuição previdenciária de serviços tomados de terceiros (nesta hipótese, há inclusive a possibilidade de atribuição de responsabilidade solidária, entre o contratante e o terceirizado, pelas contribuições devidas por este).
Um aspecto importante a ser observado é a elaboração de escrituração contábil em centros de custos distintos por obra. Ou seja, as empresas devem escriturar a folha de pagamento, os valores pagos a terceiros e, assim, os respectivos valores de contribuições previdenciárias, por cada obra executada, considerada de forma individualizada.
Os procedimentos acima mencionados, previstos pela Lei nº 8.212/1991 e pelo Decreto nº 3.048/1999 (Regulamento da Previdência Social) têm como finalidade assegurar a regularidade contábil-fiscal das empresas: por um lado, garantem ao contribuinte a previsibilidade no tocante aos valores de contribuições previdenciárias que serão pagos; por outro, proporcionam à Fazenda Nacional elementos para fins de fiscalização; ainda, como objetivo social, evitam-se contratações informais.
Contudo, na hipótese em que o contribuinte não mantenha documentação contábil e apta a comprovar o montante dos salários pagos, as contribuições previdenciárias serão apuradas por aferição indireta, um cálculo realizado sob a forma de arbitramento, no qual o valor dos salários é obtido mediante um cálculo da mão-de-obra, proporcional à área construída e ao padrão de execução da obra, conforme previsto pelo artigo 4º, §§ 4º e 6º da Lei nº 8.212/1991 (cuja redação é reiterada pelo artigo 234 do Regulamento da Previdência Social):
§ 4o Na falta de prova regular e formalizada pelo sujeito passivo, o montante dos salários pagos pela execução de obra de construção civil pode ser obtido mediante cálculo da mão de obra empregada, proporcional à área construída, de acordo com critérios estabelecidos pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, cabendo ao proprietário, dono da obra, condômino da unidade imobiliária ou empresa corresponsável o ônus da prova em contrário.
§ 6º Se, no exame da escrituração contábil e de qualquer outro documento da empresa, a fiscalização constatar que a contabilidade não registra o movimento real de remuneração dos segurados a seu serviço, do faturamento e do lucro, serão apuradas, por aferição indireta, as contribuições efetivamente devidas, cabendo à empresa o ônus da prova em contrário.
Ressalte-se, a aferição indireta não é a regra. É um procedimento utilizado de forma alternativa, na hipótese em que o contribuinte não demonstre, contábil e documentalmente, os pagamentos de salários ou serviços tomados de terceiros.
Feita essa observação quanto à regra geral, cabe assinalar que até 2021 os critérios para a referida aferição eram previstos pela IN 971/2009. Em termos bastante singelos, o valor da mão-de-obra era apurado considerando-se as tabelas do CUB (Custo Unitário Básico), divulgadas mensalmente pelos Sindicatos da Indústria da Construção Civil, aplicando-se alíquotas progressivas (escalonadas), conforme a tabela abaixo:
Nos primeiros 100m² | 4% para obras de alvenaria 2% para obras de madeira ou mista |
Entre 100m² a 200m² | 8% para obras de alvenaria 5% para obras de madeira ou mista |
Entre 200m² a 300m² | 14% para obras de alvenaria 11% para obras de madeira ou mista |
Acima de 300m² | 20% para obras de alvenaria 15% para obras de madeira ou mista |
Sucede que os parâmetros acima foram significativamente alterados pela edição da Instrução Normativa RFB nº 2.021/2021, a qual passou a vigorar em junho/2021, que instituiu o SERO (Serviço Eletrônico para Aferição de Obras), novo sistema da Receita Federal no qual o contribuinte presta as informações necessárias à aferição de obras, inclusive as relativas à remuneração utilizada na execução (salários, notas fiscais/faturas/recibos de serviços tomados).
Em substituição ao CUB, foi instituído o Valor Atualizado Unitário (VAU), índice elaborado e divulgado pela própria Receita Federal do Brasil e que considera os valores de cada espécie de destinação de obra (por exemplo, residência unifamiliar, comercial, galpão industrial ou projeto de interesse social).
No primeiro mês de vigência, o VAU utilizou a média dos valores dos padrões de construção constantes na tabela correlata ao CUB no mês anterior, com acréscimo de 1%. Após a implementação, o VAU é atualizado mensalmente pela variação percentual do custo médio por metro quadrado no Brasil, considerando, para tanto, o valor indicado pelo IBGE no SINAPI (Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil). E, por fim, no início de cada ano os valores do VAU são revistos, mediante a variação do CUB na capital de cada Estado no ano anterior.
A substituição do CUB pelo VAU, considerada isoladamente, apresenta em determinadas hipóteses vantagem econômica para o contribuinte, mas em outras situações um aumento no valor das contribuições. Vejam-se abaixo alguns exemplos com aferição realizada em dezembro/2021:
· uma residência unifamiliar de alto padrão, com aferição realizada em dezembro/2021: pelo CUB o valor da mão-de-obra era de R$ 2.970,09; já pelo VAU o valor equivale a R$ 2.481,39.
· um empreendimento multifamiliar de alto padrão com mais de 8 pavimentos, o valor do CUB é de R$ 2.482,29, enquanto o valor do VAU corresponde a R$ 2.109,88;
· diversamente, na construção de um empreendimento multifamiliar de padrão baixo (até 7 pavimentos), o CUB apresenta um valor de R$ 1.731,61 e o VAU o valor de R$ 2.109,88.
Mas a principal alteração consiste no estabelecimento de uma alíquota única de 20% (vinte por cento) sobre o custo global da obra, em substituição às alíquotas progressivas que, até então, eram utilizadas na sistemática de aferição indireta.
Esse aumento é elucidado pelos exemplos abaixo:
Imóvel de 500m², com custo global da obra de R$ 400.000,00 | ||
Regra anterior - alíquotas progressivas | Valor | Regra atual |
Até 100m² - 4% | R$ 3.200,00 | - |
Entre 100m² a 200m² - 8% | R$ 6.400,00 | - |
Entre 200m² a 300m² - 14% | R$ 11.200,00 | - |
Acima de 300m² - 20% | R$ 32.000,00 | - |
TOTAL | R$ 52.800,00 | R$ 80.000,00 |
Imóvel de 100m², com custo global da obra de R$ 100.000,00 | ||
Regra anterior - alíquotas progressivas | Valor | Regra atual |
Até 100m² - 4% | R$ 4.000,00 | - |
Entre 100m² a 200m² - 8% | - | - |
Entre 200m² a 300m² - 14% | - | - |
Acima de 300m² - 20% | - | - |
TOTAL | - | R$ 20.000,00 |
Diante dessas alterações, reitera-se a importância de que as empresas mantenham contabilidade regular, escriturando a folha de pagamento, os valores pagos a terceiros e, assim, os respectivos valores de contribuições previdenciárias, em centros de custos distintos por cada obra executada.
Alan Luiz Bonat
Advogado especialista em Direito e Processo Tributário do
De Paola e Panasolo Sociedade de Advogados